terça-feira, 18 de maio de 2010

As 4 Ecologias


Segundo Leonardo Boff, existem 4 divisões da Ecologia; Ambiental, Social, Mental e Integral. A terceira, a ecologia mental, chamada também de ecologia profunda, sustenta que as causas do déficit da Terra não se encontram apenas no tipo de sociedade que atualmente temos. Mas também no tipo de mentalidade que vigora, cujas raízes alcançam épocas anteriores à nossa história moderna, incluindo a profundidade da vida psíquica humana consciente e inconsciente, pessoal e arquetípica.
Há em nós instintos de violência, vontade de dominação, arquétipos sombrios que nos afastam da benevolência em relação à vida e à natureza. Aí dentro da mente humana se iniciam os mecanismos que nos levam a uma guerra contra a Terra. Eles se expressam por uma categoria: a nossa cultura antropocêntrica. O antropocentrismo considera o ser humano rei/rainha do universo. Pensa que os demais seres só têm sentido quando ordenados ao ser humano; eles estão aí disponíveis ao seu bel-prazer. Esta estrutura quebra com a lei mais universal do universo: a solidariedade cósmica. Todos os seres são interdependentes e vivem dentro de uma teia intrincadíssima de relações. Todos são importantes.
Não há isso de alguém ser rei/rainha e considerar-se independente sem precisar dos demais. A moderna cosmologia nos ensina que tudo tem a ver com tudo em todos os momentos e em todas as circunstâncias. O ser humano esquece esta realidade. Afasta-se e se coloca sobre as coisas em vez de sentir-se junto e com elas, numa imensa comunidade planetária e cósmica. Importa recuperarmos atitudes de respeito e veneração para com a Terra.
Isso somente se consegue se antes for resgatada a dimensão do feminino no homem e na mulher. Pelo feminino o ser humano se abre ao cuidado, se sensibiliza pela profundidade misteriosa da vida e recupera sua capacidade de maravilhamento. O feminino ajuda a resgatar a dimensão do sagrado. O sagrado impõe sempre limites à manipulação do mundo, pois ele dá origem à veneração e ao respeito, fundamentais para a salvaguarda da Terra. Cria a capacidade de re-ligar todas as coisas à sua fonte criadora que é o Criador e o Ordenador do universo. Desta capacidade re-ligadora nascem todas as religiões. Precisamos hoje revitalizar as religiões para que cumpram sua função religadora.
Bibliografia mínima de orientação
-Berry, T., O sonho da Terra, Vozes, Petrópolis 1991
- Boff, L., A nova era: a civilização planetária, Atica, S.Paulo 1995.
- Boff, L.,Eco-espiritualidade:sentir, pensar e amar como Terra, em Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres, Atica, S.Paulo 1995, pp.285-307.
- Lutzenberger, J., Gaia, o planeta vivo(por um caminho suave), L&PM 1990, Porto Alegre 1990.
- Prigogine, I. E Stengers I, A nova aliança, Editora da Universidade de Brasilia, Brasilia 1990.
- Sagan, C., Pálido ponto azul, Companhia das Letras, S.Paulo 1996.
- Unger, N.M., Encantamento do humano:ecologia e espiritualidade, Loyola, S.Paulo 1997.
-Zohar, D.e Dr. Ian Marshall, QS, Inteligência espiritual, Record, Rio de Janeiro 2000







sexta-feira, 14 de maio de 2010

Hannah Arendt

No momento em que a sociedade percebe um grande vazio político e as estruturas básicas dos sistemas de governo dão sinais de não suportar a evolução social em seus avanços e seus defeitos, Hannah Arendt vem ganhando destaque no cenário da literatura filosófica política. Aluna de Karl Jaspers, teóloga, judia-alemã, aproveitou a intelectualidade e a formação para relacionar conceitos dos grandes filósofos que até então vinham trazendo iluminismo ao mundo não sabendo que muitos horrores ainda viriam. A sua trajetória se constrói no momento mais conturbado da história moderna. Morando nos Estados Unidos ela vê o mundo ruir em guerras e terror por todos cantos. Abandonou sua pátria e sua língua mãe para ganhar a observação global da decadência humana do início do século. Irá morrer em meio a guerra fria que aquecia a hipocrisia governamental mundial e tentava curar as feridas da guerra do Vietnã. Já não havia mais tempo para explicar a Vida do Espírito que os homens ainda pensavam ter.
Ainda na Alemanha na inocência dos 11 anos, construindo seus remotos pensamentos de estranheza, observa a Revolução Russa marchando apressada para uma pretensa unidade total, e Stalin, despertaria rumos marcantes para o seu pensamento sobre o totalitarismo que se completariam mais tarde com Hitler. Talvez tão nova não entendesse a falta de humanismo do humano e defende a tese de doutorado do Conceito de Amor em Santo Agostinho. Ali ela já daria sinais de um grande questionamento político e a tentativa de explicar e sugerir alternativas para nossa sociedade atual. Mas ainda viriam duas guerras com terror e perseguição ainda maior. Entre guerras e países seu pensamento ganha o mundo.
A tentativa de explicar o mal ou a sua banalidade, não foi compreendida em Eichmann em Jerusalém que de certa forma fecha um ciclo de pensamento onde a moral e o fim da tradição está em jogo. Como julgar a responsabilidade? E lança ao mundo um grande questionamento moral intrigante e irritante à comunidade judia. Estariam os juristas prontos a suportar um julgamento nazista individual, ou um sistema de governo de uma nação, com base em seus princípios jurídicos tradicionais e passionais. Arendt percebe que o mundo não entende como os nazistas poderiam estar à frente de ações de terror e estarem ao mesmo tempo envolvidos como uma peça de uma engrenagem num princípio moral único.
Hannah Arendt propõe uma leitura atenta, não diferente de outros filósofos, implicando uma decodificação e ordenação do seu pensamento. As guerras irão lhe proporcionar um trabalho incessante em obras clássicas que soam como um alerta mundial ao desmoronamento da tradição e deformidades da natureza humana. Ela faz uma passagem nos principais filósofos alemães, buscando ali a origem dessa mudança contemporânea com a tradição, unindo Aristóteles, Sócrates e Platão aos alemães, Kant, Hegel, Kierkegaard, Nietzsche e Marx na tentativa de entender elementos como a tradição a vontade, a fé, a razão, a identidade ontológica. Logo após chega ao clássico de sua obra da criação do homem de si mesmo, pois a ação política não pode ser originalmente monológica como quer a razão pura, a Condição Humana trás a existência de três experiências humanas básicas, e como Celso Lafer bem coloca; “com Heidegger ela aprende que o pensar e o estar vivo constituem uma unidade que se funde”. Assim ela vai chegar ao lado fecundo do humano com sua coletividade, agindo conjuntamente na vida pública, permitindo a liberdade pela comunicação, vendo a política como uma questão de dignidade.

Texto de Ricardo Gomes Ribeiro

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Economia, sustentabilidade e novos indicadores de desenvolvimento

 
A professora da PUCRS e pesquisadora da FEE, Clitia Helena Backx Martins, acredita que estamos avançando no debate sobre economia e sustentabilidade. Entretanto, continua, “ainda há muito para fazer em termos de educação ambiental e conscientização, especialmente no que diz respeito aos processos de reeducação para um consumo nos moldes de conforto essencial e simplicidade voluntária”. Na entrevista que segue, concedida, por e-mail, à IHU On-Line, ela aponta que “as Nações Unidas têm se empenhado (...) a valorar os recursos naturais, em especial a água. Evidentemente, esses recursos são uma fonte importantíssima de riqueza, mas há questões de geopolítica que impedem que os países que os concentram em seu território sejam considerados como os mais ricos potencialmente no planeta”.
“Economia e sustentabilidade: novos indicadores de desenvolvimento” será o tema a ser apresentado pela professora Clitia na próxima quinta-feira, na Unisinos, das 17h30min às 19h, na Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros – IHU. O evento é gratuito.
Graduada em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Clitia Martins é pesquisadora da Fundação de Economia e Estatística do Governo do Estado do Rio Grande do Sul - FEE e professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, no Departamento de Economia e no Instituto do Meio Ambiente. Também é diretora do Núcleo Sul da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica - ECOECO, vinculada à International Society for Ecological Economics - ISEE, participante da Red Iberoamericana de Investigadores sobre Globalización y Território e da Red Iberoamericana de Economia Ecológica REDIBEC. É autora de Trabalhadores na Reciclagem do Lixo: Dinâmicas Econômicas, Socioambientais e Políticas na Perspectiva de Empoderamento (Porto Alegre: FEE, 2005); e organizadora de Indicadores Econômico-Ambientais na Perspectiva da Sustentabilidade (Porto Alegre: FEE/Fepam, 2005).

Confira a entrevista...

terça-feira, 11 de maio de 2010

Seria chover no molhado, por Marcos Rolim*

Acompanhei com atenção a sessão do STF sobre o pleito da OAB a respeito da Lei da Anistia. A lei, como se sabe, nunca mencionou crimes como a tortura. Ela perdoou os ?crimes políticos e conexos?, ponto. A pergunta, então, era: a tortura, o estupro, o assassinato de presos, a ocultação de cadáveres são crimes ?conexos?? Pois o STF, por sete votos a dois, disse que sim, que esses crimes estão cobertos pela anistia. Bem, não sei em que mundo vivem os ministros do Supremo, mas, no planeta Terra, tais delitos não são políticos ou ?conexos?.

O mais impressionante não foi o resultado, mas a linha de argumentação empregada. Por ela, a anistia representou uma ?ampla negociação? entre governo e oposição na época. A hipocrisia tem lá suas regras e se sabe que rende homenagens à virtude. Natural, então, que os ministros afirmem sua ?repulsa? à tortura no exato momento em que sepultam a possibilidade de processar torturadores. A mentira, entretanto, precisa ser chamada pelo seu nome. A Lei da Anistia não foi o resultado de negociação alguma. Paulo Sérgio Pinheiro ? ex-secretário de Direitos Humanos no governo Fernando Henrique ? lembra que em 1979, pouco antes da votação no Congresso, as oposições organizaram o ?Dia Nacional de Repúdio ao Projeto de Anistia do governo?. Em São Paulo, a OAB realizou ato público para repudiar a autoanistia em curso. E como foi o resultado da votação no Congresso? A lei foi aprovada com 206 votos da Arena, o partido da ditadura. O MDB votou maciçamente contra o projeto com 201 votos (!). Este foi o ?ambiente de ampla negociação? ao qual fizeram referência os ministros do STF, ponderação logo referendada por grande parte da mídia.

Há, ainda, outra mentira histórica: toda a direita no Brasil afirma que ?crimes foram cometidos pelos dois lados?. Há, em qualquer hipótese, entretanto, uma diferença básica: todos os que pegaram em armas contra a ditadura ? um princípio consagrado pelo direito internacional ? foram mortos ou presos e/ou torturados e/ou exilados e/ou perseguidos; mas nenhum torturador, assassino ou estuprador a serviço do regime militar foi responsabilizado. Os militantes da esquerda armada que sobreviveram são conhecidos, possuem nome e endereço. Seus algozes são sombras e o Brasil não sabe seus nomes. A depender do STF, nunca saberá. O governo Lula e o PT deram suficientes demonstrações de covardia. O primeiro, sustentou oficialmente a pizza através da Advocacia-Geral; o segundo, calou-se, como era conveniente. A imprensa não pôde observar isto, porque já havia montado um escarcéu sobre o Programa de Direitos Humanos e acusado o governo de querer revisar a Lei. Aliás, a mídia sequer se interessou em saber por que o ministro Toffoli não apareceu na sessão. Justiça seja feita, Tarso Genro foi um dos poucos a se manifestar com dignidade sobre o tema; mas foi só. Em 1971, logo após a troca de 70 presos políticos pelo embaixador suíço, um cinegrafista americano tomou vários depoimentos dos brasileiros recém chegados ao Chile. Isto virou um documentário disponível em http://www.linktv.org/programs/brazil-a-report-on-torture. Tanto quanto sei, é o único registro do tipo feito naquela época. O conjunto é impressionante. Maria Auxiliadora Lara Barcellos e Frei Tito estão entre os entrevistados. Ambos se suicidariam no exílio alguns anos depois. Vale a pena acompanhar os relatos. Seria chover no molhado, eu sei, se o molhado não fosse sangue.

*Jornalista