sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Nesses momentos políticos…

Fantasmas induzidos

Por Flavio Koutzii

A idéia da pacificação política e da polarização tem sido na última década uma das leituras centrais da realidade gaúcha. É claro também que, em certa medida, se trabalha a mesma noção para avaliar o cenário nacional, talvez menos enfaticamente.
No caso gaúcho se pega carona nas tradições históricas e até nas “polarizações” esportivas, de Chimangos e Maragatos à Grêmio e Internacional, essa lógica binária seria de fato um jeito gaúcho de ser. Estas e outras referências sociais e esportivas são reais, o que é forçado, é estendê-las artificialmente para o ambiente político do Rio Grande do Sul nos últimos anos.
Na verdade trata-se de um artifício que visa recobrir o sentido natural das diferenças e tensões, bem como conflitos próprios da sociedade democrática. O que é inaceitável é produzir uma maximização desta suposta conflitividade para transformar a suposta pacificação numa grande receita política eleitoral.[...] leia o artigo  na íntegra.

sábado, 25 de setembro de 2010

Leonardo Boff: A mídia comete sim abusos ao atacar Lula e Dilma

O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de ideias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de fatos, a distorção e a mentira direta.

Por Leonardo Boff

Sou profundamente pela liberdade de expressão em nome da qual fui punido com o "silêncio obsequioso" pelas autoridades do Vaticano. Sob risco de ser preso e torturado, ajudei a editora Vozes a publicar corajosamente o "Brasil Nunca Mais", onde se denunciavam as torturas, usando exclusivamente fontes militares, o que acelerou a queda do regime autoritário.

Esta história de vida me avalisa fazer as críticas que ora faço ao atual enfrentamento entre o Presidente Lula e a midia comercial que reclama ser tolhida em sua liberdade. O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de ideias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de fatos, a distorção e a mentira direta.

Precisamos dar o nome a esta mídia comercial. São famílias que, quando veem seus interesses comerciais e ideológicos contrariados, se comportam como "famiglia" mafiosa. São donos privados que pretendem falar para todo Brasil e manter sob tutela a assim chamada opinião pública. São os donos de O Estado de São Paulo, de A Folha de São Paulo, de O Globo, da revistaVeja, na qual se instalou a razão cínica e o que há de mais falso e chulo da imprensa brasileira. Estes estão a serviço de um bloco histórico assentado sobre o capital que sempre explorou o povo e que não aceita um Presidente que vem desse povo. Mais que informar e fornecer material para a discusão pública, pois essa é a missão da imprensa, esta mídia empresarial se comporta como um feroz partido de oposição.

Na sua fúria, quais desesperados e inapelavelmente derrotados, seus donos, editorialistas e analistas não têm o mínimo respeito devido a mais alta autoridade do país, ao Presidente Lula. Nele veem apenas um peão a ser tratado com o chicote da palavra que humilha.

Mas há um fato que eles não conseguem digerir em seu estômago elitista. Custa-lhes aceitar que um operário, nordestino, sobrevivente da grande tribulação dos filhos da pobreza, chegasse a ser Presidente. Este lugar, a Presidência, assim pensam, cabe a eles, os ilustrados, os articulados com o mundo, embora não consigam se livrar do complexo de vira-latas, pois se sentem meramente menores e associados ao grande jogo mundial. Para eles, o lugar do peão é na fábrica produzindo.

Como o mostrou o grande historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma), "a maioria dominante, conservadora ou liberal, foi sempre alienada, antiprogresssita, antinacional e não contemporânea. A liderança nunca se reconciliou com o povo. Nunca viu nele uma criatura de Deus, nunca o reconheceu, pois gostaria que ele fosse o que não é. Nunca viu suas virtudes, nem admirou seus serviços ao país, chamou-o de tudo -Jeca Tatu-; negou seus direitos; arrasou sua vida e logo que o viu crescer ela lhe negou, pouco a pouco, sua aprovação; conspirou para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que contiua achando que lhe pertence (p.16)".

Pois esse é o sentido da guerra que movem contra Lula. É uma guerra contra os pobres que estão se libertando. Eles não temem o pobre submisso. Eles têm pavor do pobre que pensa, que fala, que progride e que faz uma trajetória ascedente como Lula. Trata-se, como se depreende, de uma questão de classe. Os de baixo devem ficar em baixo. Ocorre que alguém de baixo chegou lá em cima. Tornou-se o Presidente de todos os brasileiros. Isso para eles é simplesmente intolerável.

Os donos e seus aliados ideológicos perderam o pulso da história. Não se deram conta de que o Brasil mudou. Surgiram redes de movimentos sociais organizados, de onde vem Lula, e tantas outras lideranças. Não há mais lugar para coroneis e para "fazedores de cabeça" do povo. Quando Lula afirmou que "a opinião pública somos nós", frase tão distorcida por essa midia raivosa, quis enfatizar que o povo organizado e consciente arrebatou a pretensão da midia comercial de ser a formadora e a porta-voz exclusiva da opinião pública. Ela tem que renunciar à ditadura da palabra escrita, falada e televisionada e disputar com outras fontes de informação e de opinião.

O povo cansado de ser governado pelas classes dominantes resolveu votar em si mesmo. Votou em Lula como o seu representante. Uma vez no Governo, operou uma revolução conceptual, inaceitável para elas. O Estado não se fez inimigo do povo, mas o indutor de mudanças profundas que beneficiaram mais de 30 milhões de brasileiros. De miseráveis se fizeram pobres laboriosos, de pobres laboriosos se fizeram classe média baixa e de classe média baixa de fizeram classe média. Começaram a comer, a ter luz em casa, a poder mandar seus filhos para a escola, a ganhar mais salário, em fim, a melhorar de vida.

Outro conceito inovador foi o desenvolvimento com inclusão soicial e distribuição de renda. Antes havia apenas desenvolvimento/crescimento que beneficiava aos já beneficiados à custa das massas destituidas e com salários de fome. Agora ocorreu visível mobilização de classes, gerando satisfação das grandes maiorias e a esperança que tudo ainda pode ficar melhor. Concedemos que no Governo atual há um déficit de consciência e de práticas ecológicas. Mas, importa reconhecer que Lula foi fiel à sua promessa de fazer amplas políticas públicas na direção dos mais marginalizados.

O que a grande maioria almeja é manter a continuidade deste processo de melhora e de mudança. Ora, esta continuidade é perigosa para a mídia comercial que assiste, assustada, ao fortalecimento da soberania popular que se torna crítica, não mais manipulável e com vontade de ser ator dessa nova história democrática do Brasil. Vai ser uma democracia cada vez mais participativa e não apenas delegatícia. Esta abria amplo espaço à corrupção das elites e dava preponderância aos interesses das classes opulentas e ao seu braço ideológico que é a mídia comercial. A democracia participativa escuta os movimentos sociais, faz do Movimento dos Sem Terra (MST), odiado especialmente pela VEJA, que faz questão de não ver; protagonista de mudanças sociais não somente com referência à terra, mas também ao modelo econômico e às formas cooperativas de produção.

O que está em jogo neste enfrentamento entre a midia comercial e Lula/Dilma é a questão: que Brasil queremos? Aquele injusto, neocoloncial, neoglobalizado e, no fundo, retrógrado e velhista; ou o Brasil novo com sujeitos históricos novos, antes sempre mantidos à margem e agora despontando com energias novas para construir um Brasil que ainda nunca tínhamos visto antes?

Esse Brasil é combatido na pessoa do Presidente Lula e da candidata Dilma. Mas estes representam o que deve ser. E o que deve ser tem força. Irão triunfar a despeito das más vontades deste setor endurecido da midia comercial e empresarial. A vitória de Dilma dará solidez a este caminho novo ansiado e construido com suor e sangue por tantas gerações de brasileiros.

Fonte: Adital

sábado, 24 de julho de 2010

O "jeitinho" brasileiro do presidencialismo

O  diretor do Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Oxford (Inglaterra), Timothy Power, um estudioso do Brasil, apresentou a experiência do presidencialismo de alianças, “um manual para governar o País”. Trata-se de modelo com o “jeitinho” nacional, praticado durante os governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Mais do que um escândalo de corrupção, para o professor, o mensalão – esquema de compra de votos de parlamentares – resultou da quebra de regras desse sistema. Power diz que presidentes latino-americanos se comportam como primeiros-ministros europeus: formam e cultivam alianças interpartidárias em seus congressos e parlamentos. “Governos de coalizão têm taxas de sucesso legislativo semelhantes às de ministérios de partidos únicos, que existem, por exemplo, nos Estados Unidos”, afirma, complementando que não há diferença estatística na aprovação de leis. O presidencialismo, segundo Power, foi criticado pelo sociólogo espanhol Juan Lins, que apontou imobilismo (se um chefe do executivo não tem maioria no Congresso, não governa), exclusão dos perdedores por muito tempo, legitimidade dupla (se os representantes dos poderes legislativo e executivo não forem eleitos simultaneamente, o mais recente se torna mais aceito) e ambiguidade do cargo (o presidente representa a nação e uma opção partidária). Power diz que a partir dos anos 90 essa visão se modificou e hoje se pensa que os presidentes dispõem de ferramentas para governar. O “manual” tem como primeiro item a formação de alianças desconexas, com partidos de ideologias diferentes. Foi o que fizeram Fernando Henrique, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), ao se coligar com o Partido da Frente Liberal (PFL) – hoje Democratas (Dem), e Lula, do Partido dos Trabalhadores (PT), na aliança com o Partido Liberal (PL) e mais adiante com o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), entre outros. “FHC mostrou que não é importante somente compor, mas também satisfazer os partidos participantes com recursos, loteamento de cargos”, destaca Power. Outra regra é a proporcionalidade – um partido deve ter o mesmo peso no Ministério e no Congresso. No primeiro ano de mandato, Lula não seguiu esse princípio. O governo era inicialmente formado por 28% de políticos do PT e 60% na segunda composição, já com o PMDB, no final de 2003. Grande parte das emendas de 2002 se destinaram a partidos de fora da coligação (76%) e 89% das emendas coletivas contemplaram estados governados pela oposição. Esse poder de liberar os recursos cabe ao presidente. No segundo mandato, Lula ajustou sua estratégia. O PT não concentra a maioria das pastas. Power, norte-americano radicado na Inglaterra, traça um perfil dos “mensaleiros”, agentes do esquema conhecido como mensalão, descoberto em 2005: tiveram votações dos seus estados como um todo, dificultando o controle por parte dos eleitores, ganharam mais apoio dos partidos durante a campanha e são os que mais apresentaram emendas ao Orçamento – mas não receberam acima da média. “São o estereótipo do político clientelista. A sua fome não foi saciada.” Três foram cassados – José Dirceu, Roberto Jefferson e Pedro Corrêa – e um renunciou – Valdemar Costa Neto. O conferencista propõe investigações sobre os impactos do presidencialismo de alianças para a transparência e qualidade da democracia latino- americana. Cita alguns: diluição de políticas públicas (pois há muitos a satisfazer), a imagem negativa do sistema (os partidos têm reputações de oportunistas) e o custo alto de governar, com distorções orçamentárias e escândalos de corrupção.

Trecho da Aula Inaugural da 1ª turma de Doutorado de Ciências Sociais da PUCRS, mar 2010.
Texto publicado na Revista PUCRS Informação - Ano XXXIII - Nº 150 - Julho-Agosto/2010.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

A quem servem os partidos políticos?

Os indivíduos atuam por interesse, isto é, esperam recompensas. É a probabilidade de ser recompensado que move a política. Mesmo os idealistas intentam alcançar algo, nem que seja o reconhecimento de que são missionários de um novo mundo. Porém, o determinante é a recompensa material – vide a trajetória e o deslumbramento da geração que ascendeu socialmente pela militância política. São os interesses que prevalecem.
A palavra interesse, de origem latina, significa “estar entre”, “no meio”, “participar”. Os partidos políticos são organizações voltadas essencialmente para os interesses, isto é, o estar entre os que têm acesso a determinados bens simbólicos e materiais inacessíveis à maioria dos governados. Uma das suas principais funções é propiciar a socialização dos cargos e do patrimônio público à minoria que compõe o sistema político, a “sociedade política”.
Os partidos almejam o poder; alguns imaginam fazer a revolução e conquistar o Estado. No imediato, isto se traduz na conquista do governo e de posições no aparato estatal. Ocorre, então, uma inversão: são as instituições do Estado burguês que conquistam os partidos. O objetivo se reduz à garantia dos cargos no partido e no Estado, e, assim, ter o poder de multiplicar os pães, de transferir aos seguidores e discípulos as benesses da "máquina" do Estado – e ainda há quem lance mão do discurso de que é “exigência das bases” ou que foi “chamado a desempenhar a responsabilidade de participar do governo”, como se fosse um encargo. Numa realidade sócio-política em que o governante, desde a esfera municipal, tem o "poder da caneta”, isto é, pode indicar milhares de cargos de confiança, é de se imaginar a capacidade de comprometer o partido com a sua política. Eis o mistério nem sempre manifesto da política institucional.
Os partidos ideológicos imaginam romper com este esquema ao se proporem a revolucionar a política, isto é, a priorizarem a política extra-institucional e, no limite, a instrumentalizar a democracia qualificada como burguesa. Historicamente, porém, o resultado foi a instauração de ditaduras, da prevalência de uma nova classe social que age em nome do povo. O dilema dos partidos pretensamente revolucionários é que eles aceitam jogar o jogo e, assim, tão logo crescem em densidade eleitoral e organizativa tendem a descaracterizar a ideologia.
A radicalidade é proporcional à fragilidade eleitoral. Quanto menos tem a perder eleitoralmente, mais atua como a consciência crítica; quanto menor a força eleitoral, maior a vocação missionária e verborrágica. O projeto de poder o impele a ampliar inserção eleitoral e, portanto, a flexibilizar o programa e mensagem. Na medida em que disputam o Estado, estes partidos terminam por priorizar a estratégia da ocupação dos espaços em detrimento dos princípios, relegados à retórica revolucionária. E isto se dá na proporção das vitórias eleitorais.
O saber popular identifica bem a quem servem os partidos políticos. O tão falado povo empiricamente observa que, a despeito da retórica revolucionária, a vida permanece a mesma no dia seguinte às eleições. Ainda que compartilhe da alegria e/ou tristeza pela vitória e/ou derrota do partido “X” ou “Y”, logo retorna à dura realidade da luta pela sobrevivência, longe dos bastidores da política. E ainda que tenha depositado esperanças num determinado partido e seus eternos candidatos, logo também conclui que “são todos iguais”. Os indivíduos podem não compreender as teorias políticas, mas não são néscios; percebem claramente quem se locupleta com os partidos e mesmo os revolucionários são identificados aos profissionais da política.
Publicado em 19/06/2010 by Antonio Ozaí da Silva
Publicado em blog do ozaípolítica

O Panóptico: Foucault confirma Orwell

Ao ler Admirável Mundo Novo de Huxley e 1984de George Orwell, fiquei com a impressão de que aquele aparato estatal de vigilância com a Grande Tela e o Grande Irmão, as torturas, a tensão constante num ambiente de delação, fazia referência mais especificamente aos regimes totalitários de esquerda ou de direita, enquanto os modos pseudo-democráticos de condução e massificação deAdmirável Mundo Novo se identificavam categoricamente com a sociedade tecnológica, consumista e capitalista em que vivemos. As brilhantes comparações de Aldous Huxley no prefácio do seu ensaio de 1958, Regresso ao Admirável Mundo Novo reforçaram esta idéia de que os elementos coercitivos de 1984 caracterizavam as ditaduras, inclusive a brasileira dos militares pós 64 e os elementos de manipulação, de condução sutil “como um gado” de AMN seriam características das “democracias” capitalistas ocidentais, portanto com analogia mais acentuada com a nossa realidade atual.
Porém, ao ler sobre o pensamento e a obra de Michel Foucault, principalmente Vigiar e Punir(1975), percebi que o 1984 de Orwell está muito mais presente em nossa vida atual do que eu pensava. Senão superando a presença indiscutível de Admirável Mundo Novo, pelo menos participando em pé de igualdade no que diz respeito ao controle social em nosso tempo. Em Vigiar e Punir, Foucault trata com muita propriedade do tema da “Sociedade Disciplinar”, implantada a partir dos séculos XVII e XVIII, consistindo basicamente num sistema de controle social através da conjugação de várias técnicas de classificação, de seleção, de vigilância, de controle, que se ramificam pelas sociedades a partir de uma cadeia hierárquica vindo do poder central e se multiplicando numa rede de poderes interligados e capilares. O ser humano é selecionado e catalogado individualmente, não no sentido de valorizar suas particularidades que o fazem um ser único, “um mamífero com um grande cérebro”, como disse Huxley, mas para melhor controlá-lo. O sentido é dissecar o corpo social, transformar esta massa amorfa em micro seções individuais, para conhecer e controlar. O Poder nesse sentido é exercido de forma celular. Pois como diz Foucault, “toda forma de saber produz poder”. Dividir, classificar, conhecer cada célula social para governar. O poder é então baseado na “Microfísica do Poder”, outra obra de Foucault. O filósofo aponta que a motivação de toda esta rede de controle se justifica pela necessidade que a burguesia teve de efetivar um controle mais determinado sobre as massas, que poderiam representar um perigo explosivo, se fossem levados a sério os ideais da Revolução Francesa e do Iluminismo. Seria como se fossem abertas as comportas de uma imensa represa, cujas águas foram mantidas estancadas a milênios desde a Antigüidade remota, através dos mais variados mecanismos de poder, cuja argamassa da ignorância popular foi um dos elementos mais eficazes da sustentação desta barragem. Se deixassem essa imensa quantidade de água descer rio abaixo, livre com o conhecimento do Iluminismo, ela certamente inundaria e destruiria as luxuosas instalações do poder e sua corte finíssima, que hoje se traduz por burguesia. Era preciso consertar a velha barragem e parar essa força descomunal das massas ou então construir uma outra barragem e reservar o trinômio Liberdade, Igualdade e Fraternidade para os sócios do seleto clube burguês. Assim foi feito com a implantação da “Tecnologia das Disciplinas”.

terça-feira, 18 de maio de 2010

As 4 Ecologias


Segundo Leonardo Boff, existem 4 divisões da Ecologia; Ambiental, Social, Mental e Integral. A terceira, a ecologia mental, chamada também de ecologia profunda, sustenta que as causas do déficit da Terra não se encontram apenas no tipo de sociedade que atualmente temos. Mas também no tipo de mentalidade que vigora, cujas raízes alcançam épocas anteriores à nossa história moderna, incluindo a profundidade da vida psíquica humana consciente e inconsciente, pessoal e arquetípica.
Há em nós instintos de violência, vontade de dominação, arquétipos sombrios que nos afastam da benevolência em relação à vida e à natureza. Aí dentro da mente humana se iniciam os mecanismos que nos levam a uma guerra contra a Terra. Eles se expressam por uma categoria: a nossa cultura antropocêntrica. O antropocentrismo considera o ser humano rei/rainha do universo. Pensa que os demais seres só têm sentido quando ordenados ao ser humano; eles estão aí disponíveis ao seu bel-prazer. Esta estrutura quebra com a lei mais universal do universo: a solidariedade cósmica. Todos os seres são interdependentes e vivem dentro de uma teia intrincadíssima de relações. Todos são importantes.
Não há isso de alguém ser rei/rainha e considerar-se independente sem precisar dos demais. A moderna cosmologia nos ensina que tudo tem a ver com tudo em todos os momentos e em todas as circunstâncias. O ser humano esquece esta realidade. Afasta-se e se coloca sobre as coisas em vez de sentir-se junto e com elas, numa imensa comunidade planetária e cósmica. Importa recuperarmos atitudes de respeito e veneração para com a Terra.
Isso somente se consegue se antes for resgatada a dimensão do feminino no homem e na mulher. Pelo feminino o ser humano se abre ao cuidado, se sensibiliza pela profundidade misteriosa da vida e recupera sua capacidade de maravilhamento. O feminino ajuda a resgatar a dimensão do sagrado. O sagrado impõe sempre limites à manipulação do mundo, pois ele dá origem à veneração e ao respeito, fundamentais para a salvaguarda da Terra. Cria a capacidade de re-ligar todas as coisas à sua fonte criadora que é o Criador e o Ordenador do universo. Desta capacidade re-ligadora nascem todas as religiões. Precisamos hoje revitalizar as religiões para que cumpram sua função religadora.
Bibliografia mínima de orientação
-Berry, T., O sonho da Terra, Vozes, Petrópolis 1991
- Boff, L., A nova era: a civilização planetária, Atica, S.Paulo 1995.
- Boff, L.,Eco-espiritualidade:sentir, pensar e amar como Terra, em Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres, Atica, S.Paulo 1995, pp.285-307.
- Lutzenberger, J., Gaia, o planeta vivo(por um caminho suave), L&PM 1990, Porto Alegre 1990.
- Prigogine, I. E Stengers I, A nova aliança, Editora da Universidade de Brasilia, Brasilia 1990.
- Sagan, C., Pálido ponto azul, Companhia das Letras, S.Paulo 1996.
- Unger, N.M., Encantamento do humano:ecologia e espiritualidade, Loyola, S.Paulo 1997.
-Zohar, D.e Dr. Ian Marshall, QS, Inteligência espiritual, Record, Rio de Janeiro 2000







sexta-feira, 14 de maio de 2010

Hannah Arendt

No momento em que a sociedade percebe um grande vazio político e as estruturas básicas dos sistemas de governo dão sinais de não suportar a evolução social em seus avanços e seus defeitos, Hannah Arendt vem ganhando destaque no cenário da literatura filosófica política. Aluna de Karl Jaspers, teóloga, judia-alemã, aproveitou a intelectualidade e a formação para relacionar conceitos dos grandes filósofos que até então vinham trazendo iluminismo ao mundo não sabendo que muitos horrores ainda viriam. A sua trajetória se constrói no momento mais conturbado da história moderna. Morando nos Estados Unidos ela vê o mundo ruir em guerras e terror por todos cantos. Abandonou sua pátria e sua língua mãe para ganhar a observação global da decadência humana do início do século. Irá morrer em meio a guerra fria que aquecia a hipocrisia governamental mundial e tentava curar as feridas da guerra do Vietnã. Já não havia mais tempo para explicar a Vida do Espírito que os homens ainda pensavam ter.
Ainda na Alemanha na inocência dos 11 anos, construindo seus remotos pensamentos de estranheza, observa a Revolução Russa marchando apressada para uma pretensa unidade total, e Stalin, despertaria rumos marcantes para o seu pensamento sobre o totalitarismo que se completariam mais tarde com Hitler. Talvez tão nova não entendesse a falta de humanismo do humano e defende a tese de doutorado do Conceito de Amor em Santo Agostinho. Ali ela já daria sinais de um grande questionamento político e a tentativa de explicar e sugerir alternativas para nossa sociedade atual. Mas ainda viriam duas guerras com terror e perseguição ainda maior. Entre guerras e países seu pensamento ganha o mundo.
A tentativa de explicar o mal ou a sua banalidade, não foi compreendida em Eichmann em Jerusalém que de certa forma fecha um ciclo de pensamento onde a moral e o fim da tradição está em jogo. Como julgar a responsabilidade? E lança ao mundo um grande questionamento moral intrigante e irritante à comunidade judia. Estariam os juristas prontos a suportar um julgamento nazista individual, ou um sistema de governo de uma nação, com base em seus princípios jurídicos tradicionais e passionais. Arendt percebe que o mundo não entende como os nazistas poderiam estar à frente de ações de terror e estarem ao mesmo tempo envolvidos como uma peça de uma engrenagem num princípio moral único.
Hannah Arendt propõe uma leitura atenta, não diferente de outros filósofos, implicando uma decodificação e ordenação do seu pensamento. As guerras irão lhe proporcionar um trabalho incessante em obras clássicas que soam como um alerta mundial ao desmoronamento da tradição e deformidades da natureza humana. Ela faz uma passagem nos principais filósofos alemães, buscando ali a origem dessa mudança contemporânea com a tradição, unindo Aristóteles, Sócrates e Platão aos alemães, Kant, Hegel, Kierkegaard, Nietzsche e Marx na tentativa de entender elementos como a tradição a vontade, a fé, a razão, a identidade ontológica. Logo após chega ao clássico de sua obra da criação do homem de si mesmo, pois a ação política não pode ser originalmente monológica como quer a razão pura, a Condição Humana trás a existência de três experiências humanas básicas, e como Celso Lafer bem coloca; “com Heidegger ela aprende que o pensar e o estar vivo constituem uma unidade que se funde”. Assim ela vai chegar ao lado fecundo do humano com sua coletividade, agindo conjuntamente na vida pública, permitindo a liberdade pela comunicação, vendo a política como uma questão de dignidade.

Texto de Ricardo Gomes Ribeiro

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Economia, sustentabilidade e novos indicadores de desenvolvimento

 
A professora da PUCRS e pesquisadora da FEE, Clitia Helena Backx Martins, acredita que estamos avançando no debate sobre economia e sustentabilidade. Entretanto, continua, “ainda há muito para fazer em termos de educação ambiental e conscientização, especialmente no que diz respeito aos processos de reeducação para um consumo nos moldes de conforto essencial e simplicidade voluntária”. Na entrevista que segue, concedida, por e-mail, à IHU On-Line, ela aponta que “as Nações Unidas têm se empenhado (...) a valorar os recursos naturais, em especial a água. Evidentemente, esses recursos são uma fonte importantíssima de riqueza, mas há questões de geopolítica que impedem que os países que os concentram em seu território sejam considerados como os mais ricos potencialmente no planeta”.
“Economia e sustentabilidade: novos indicadores de desenvolvimento” será o tema a ser apresentado pela professora Clitia na próxima quinta-feira, na Unisinos, das 17h30min às 19h, na Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros – IHU. O evento é gratuito.
Graduada em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Clitia Martins é pesquisadora da Fundação de Economia e Estatística do Governo do Estado do Rio Grande do Sul - FEE e professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, no Departamento de Economia e no Instituto do Meio Ambiente. Também é diretora do Núcleo Sul da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica - ECOECO, vinculada à International Society for Ecological Economics - ISEE, participante da Red Iberoamericana de Investigadores sobre Globalización y Território e da Red Iberoamericana de Economia Ecológica REDIBEC. É autora de Trabalhadores na Reciclagem do Lixo: Dinâmicas Econômicas, Socioambientais e Políticas na Perspectiva de Empoderamento (Porto Alegre: FEE, 2005); e organizadora de Indicadores Econômico-Ambientais na Perspectiva da Sustentabilidade (Porto Alegre: FEE/Fepam, 2005).

Confira a entrevista...

terça-feira, 11 de maio de 2010

Seria chover no molhado, por Marcos Rolim*

Acompanhei com atenção a sessão do STF sobre o pleito da OAB a respeito da Lei da Anistia. A lei, como se sabe, nunca mencionou crimes como a tortura. Ela perdoou os ?crimes políticos e conexos?, ponto. A pergunta, então, era: a tortura, o estupro, o assassinato de presos, a ocultação de cadáveres são crimes ?conexos?? Pois o STF, por sete votos a dois, disse que sim, que esses crimes estão cobertos pela anistia. Bem, não sei em que mundo vivem os ministros do Supremo, mas, no planeta Terra, tais delitos não são políticos ou ?conexos?.

O mais impressionante não foi o resultado, mas a linha de argumentação empregada. Por ela, a anistia representou uma ?ampla negociação? entre governo e oposição na época. A hipocrisia tem lá suas regras e se sabe que rende homenagens à virtude. Natural, então, que os ministros afirmem sua ?repulsa? à tortura no exato momento em que sepultam a possibilidade de processar torturadores. A mentira, entretanto, precisa ser chamada pelo seu nome. A Lei da Anistia não foi o resultado de negociação alguma. Paulo Sérgio Pinheiro ? ex-secretário de Direitos Humanos no governo Fernando Henrique ? lembra que em 1979, pouco antes da votação no Congresso, as oposições organizaram o ?Dia Nacional de Repúdio ao Projeto de Anistia do governo?. Em São Paulo, a OAB realizou ato público para repudiar a autoanistia em curso. E como foi o resultado da votação no Congresso? A lei foi aprovada com 206 votos da Arena, o partido da ditadura. O MDB votou maciçamente contra o projeto com 201 votos (!). Este foi o ?ambiente de ampla negociação? ao qual fizeram referência os ministros do STF, ponderação logo referendada por grande parte da mídia.

Há, ainda, outra mentira histórica: toda a direita no Brasil afirma que ?crimes foram cometidos pelos dois lados?. Há, em qualquer hipótese, entretanto, uma diferença básica: todos os que pegaram em armas contra a ditadura ? um princípio consagrado pelo direito internacional ? foram mortos ou presos e/ou torturados e/ou exilados e/ou perseguidos; mas nenhum torturador, assassino ou estuprador a serviço do regime militar foi responsabilizado. Os militantes da esquerda armada que sobreviveram são conhecidos, possuem nome e endereço. Seus algozes são sombras e o Brasil não sabe seus nomes. A depender do STF, nunca saberá. O governo Lula e o PT deram suficientes demonstrações de covardia. O primeiro, sustentou oficialmente a pizza através da Advocacia-Geral; o segundo, calou-se, como era conveniente. A imprensa não pôde observar isto, porque já havia montado um escarcéu sobre o Programa de Direitos Humanos e acusado o governo de querer revisar a Lei. Aliás, a mídia sequer se interessou em saber por que o ministro Toffoli não apareceu na sessão. Justiça seja feita, Tarso Genro foi um dos poucos a se manifestar com dignidade sobre o tema; mas foi só. Em 1971, logo após a troca de 70 presos políticos pelo embaixador suíço, um cinegrafista americano tomou vários depoimentos dos brasileiros recém chegados ao Chile. Isto virou um documentário disponível em http://www.linktv.org/programs/brazil-a-report-on-torture. Tanto quanto sei, é o único registro do tipo feito naquela época. O conjunto é impressionante. Maria Auxiliadora Lara Barcellos e Frei Tito estão entre os entrevistados. Ambos se suicidariam no exílio alguns anos depois. Vale a pena acompanhar os relatos. Seria chover no molhado, eu sei, se o molhado não fosse sangue.

*Jornalista

sexta-feira, 30 de abril de 2010

A morte do pensamento de esquerda e as coligações

  O livro registra para sempre o que não pode ser esquecido em nosso país , recoloca a reflexão sobre a eliminação do pensamento de esquerda e de mentes que deixaram de ser brilhantes nos poucos seguntos de um apertar de gatilho. Memórias de inúmeros rostos de pessoas nem tão perigosas invadem o livro criado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, COMISSÃO ESPECIAL SOBRE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS. Ao ver que a maioria eram jovens com ideais de liberdade de expressão e liberdade política, penso que a luta deles não foi em vão por termos hoje um "estado democrático de direito". Temos direito a imprensa livre, ao voto e a elger nosso candidato, direito a ter um parlamento que pode expressar a vontade do povo, de organizar partidos e expressar nossos pensamentos, etc.  Claro, uma democracia que anda a passos lentos, e esbarra não mais na bala da repressão, mas na corrupção e disputa pelo poder. Tivemos enfim a abertura política, e junto, a abertura de espaços para a corrupção, o crime do colarinho branco, os mensalões e o clientelismo. Abrimos também um espaço para a invasão de mentes mediocres que não estão mais envolvidas com desenvolvimento do nosso país. Mentes deturpadas que querem apenas estar estar no poder. A abertura política permitiu a entrada da esquerda e nos trouxe a perda do pensamento original de esquerda. Atualmente, quase não temos mais  o pensamento de direita, todos querem ser esquerda. E a esquerda tradicional corre o risco de, em breve, não ter mais identidade, como aqueles que morreram e nunca foram homenageados, estamos matando o pensamento de esquerda, não precisamos mais das armas da repressão. O prórpio pensamento da pseudo-esquerda morre aos poucos, é um carrasco de si mesmo, e ainda temos ruas com nomes de generais.


Direito à meomória e à verdade
Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, 
COMISSÃO ESPECIAL SOBRE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Michel Foucault e o cuidado de si

"Na primeira hora do curso do dia 20 de janeiro de 1982, Michel Foucault evidencia a transformação pela qual o “cuidado de si” passou desde Alcebíades, de Platão, até o início dos séculos I e II de nossa era, caracterizada por ele como “uma verdadeira idade de ouro na história do cuidado de si” (P. 79)[1] [2].
Segundo o filósofo, esta transformação influenciou claramente as culturas posteriores, sobretudo a moral sexual européia moderna, com o regime de aphrodisia[3], entendida como uma experiência greco-histórica dos prazeres, a substância ética da moral antiga, diferente da experiência cristã da carne e da experiência moderna da sexualidade.
Seu objetivo era de destacar as relações subjetividade/verdade de uma maneira mais geral, colocando-as na dimensão histórica e, sobretudo, mostrar que, com a evolução, o cuidado de si tornou-se um verdadeiro fenômeno cultural como princípio de toda conduta racional, em toda forma de vida ativa que queria obedecer ao princípio da racionalidade moral. Não se ignorando que ele sofreu uma série de outras transformações no cristianismo primitivo, medieval, no Renascimento e no século XVII.
O autor considera que existem dois preceitos: o epimeleia heautou que é o cuidado de si-mesmo, a preocupação consigo-mesmo, etc.; e a prescrição délfica da gnôthi seauton – fórmula fundadora da questão das relações entre sujeito e verdade – que quer dizer conhece-te a ti mesmo[4]; que em certo número de textos platônicos se conjugam, como, por exemplo, em Apologia a Sócrates. Em Alcebíades, no entanto, o gnôthi seauton sempre teve uma espécie de subordinação ao epimeleia heautou, como uma maneira de aplicação concreta da regra geral de ocupar-se de si-mesmo.
Encontramos, em Alcebíades, três condições que determinavam, ao mesmo tempo, a razão de ser e a forma do cuidado de si: 1- aqueles que deveriam se ocupar de si mesmos eram jovens destinados a exercer o poder; 2 – o objetivo era o bom exercício do poder; 3 – a forma exclusiva onde ocupar-se de si é conhecer a si próprio.
Em Platão, estas três condições, que Foucault chama, também, de “determinações” ou “limitações”, desapareceram. Primeiramente, os que deveriam ocupar-se de si não eram mais, exclusivamente, jovens políticos, mas todos poderiam fazer isso, sem importar-se com a idade ou o status[5]. Em seguida, não existia mais o único objetivo de bem governar os outros, mas o cuidado tem o fim em si mesmo: em Alcebíades o objeto do cuidado era o próprio cuidado, mas o fim era a cidade, mais tarde, o “si” torna-se objeto e fim. A característica exclusiva do cuidado de si se atenua e torna-se coextensivo à vida, em um conjunto mais vasto, o que podemos chamar de conversão, epistrophê – conhecer o verdadeiro, liberar-se – um movimento que pode nos conduzir deste mundo para outro[6] [...]." 

sábado, 27 de março de 2010

A dignidade humana

“Há de haver no mundo certa quantidade de decoro,
como há de haver certa quantidade de luz.
Quando há muitos homens sem decoro, há sempre outros
que têm em si o decoro de muitos homens.
Estes são os que se rebelam com força terrível
contra os que roubam aos povos sua liberdade,
que é roubar-lhes seu decoro.
Nesses homens vão milhares de homens,
vai um povo inteiro,
vai a dignidade humana[..]".


José Julián Martí Pérez

Aniversário de Porto Alegre


Pelo centro da cidade circulam por dia ao redor de 500 mil pessoas. O mesmo centro que abriga a Praça da Matriz e congrega o Tribunal de Justiça, a catedral metropolitana, o parlamento e o Palácio Piratini, sede do executivo estadual. A arquitetura dos prédios, inspirada em padrões europeus, também é ressaltada. O coração da cidade bombeia cultura, explícita nas mais variadas formas.

A praça da Matriz também abriga o Theatro São Pedro, um dos orgulhos da cidade, em estilo barroco português e uma pequena platéia em forma de ferradura. Há quem diga que é o teatro mais bonito do Brasil. Como exemplo de estilo neoclássico, os porto-alegrenses exibem a Biblioteca Pública, com seu Salão Mourisco, ricamente decorado. Bem perto dali, todas as primaveras, na rua dos Andradas, acontece a Feira do Livro que lota o centro da capital que menos tem analfabetos no Brasil, e onde a venda de livros é a maior entre as capitais do país. Sem falar da Casa de Cultura Mário Quintana, com cinema, teatro, sala de exposições e o Café Concerto, na cúpula do antigo Hotel Majestic. Tem também o Centro Cultural CEEE Érico Veríssimo e a escadaria da Igreja Nossa Senhora das Dores.

Porto Alegre, de fato, esbanja charme. Não apenas pelos seus habiantes que receberam influências das mais diversas imigrações, (principalmente do norte da Itália, da Alemanha e dos países platinos), mas também porque se veste de cores novas a cada estação do ano. Pétalas de ipês, jacarandás e flamboaiãs compõem verdadeiros tapetes naturais nas ruas e calçadas. Não é à toa que a cidade é considerada a mais arborizada do Brasil, com 700 mil árvores em vias públicas. Para se ter uma ideia, há aproximadamente 17 metros quadrados de área verde para cada habitante.

Porto Alegre também ganha vida ao ar livre nas praças e parques, nas conversas descontraídas e no inseparável chimarrão de domingo no parque da Redenção - na verdade, Parque Farroupilha. Os 40 hectares de área do espaço formam o mais antigo e popular ponto de encontro da cidade. Aos sábados recebe a Feira Ecológica e aos domingos, o Brique da Redenção, com suas barracas de artesanato, artes plásticas, antiguidades, alimentação e manifestações culturais. E o pôr-do-sol, ícone da cidade, pode ser apreciado ao longo de 15 quilômetros que separam a Usina do Gasômetro, no Centro da Cidade, do Calçadão da Praia de Ipanema, na Zona Sul.

Porto Alegre está de aniversário, completando mais de 200 anos de história. E como é difícil, diante dessa data de tamanha importância, definir em palavras as emoções de ver, sentir e ouvir tudo que nossa “POA” tem a dizer. Ou seria possível descrever a pintura formada no lago Guaíba, com os últimos raios de sol? Relatar a experiência de ouvir o grito das torcidas de Grêmio ou Internacional em dia de clássico do nosso futebol? Não. Impossível. O “porto dos casais” nasceu mesmo é para ser vivido!


HISTÓRIA

Porto Alegre, capital gaúcha, com seu clima subtropical úmido, é uma das cidades mais arborizadas do país, além de ter um pôr-do-sol considerado um dos mais lindos do mundo. No dia 26, esta bela metrópole, nascida em 1772 e batizada com o nome de Freguesia  de São Francisco do Porto dos Casais, completa 238 anos. Durante este período, mudou várias vezes de nome: Porto de Viamão (século XVIII), depois Porto do Dorneles, em seguida Porto de São Francisco dos Casais e, finalmente, Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre.

A cidade passou por lutas sangrentas para se firmar como capital, por isto em sua bandeira está escrito “Mui Leal e Valerosa Cidade de Porto Alegre”. Banhada pelo Lago Guaíba, a cidade tem como padroeira a N. S. dos Navegantes, daí ser feriado local o dia 2 de fevereiro, quando ocorrem muitas cerimônias de fé, tanto por terra quanto por água.

Sua localização geográfica é igualmente elogiada, localizada no místico paralelo 30º. Circundada por 40 morros e uma orla fluvial de 72km, berço de gente famosa em todas as áreas, terra do Grêmio e do Inter, dos domingos no Brique da Redenção, e tema de muitos poemas de Mário Quintana, Porto Alegre é demais...

PortoWeb a internet de Porto Alegre

domingo, 7 de março de 2010

Dia 8 de Março

No Dia 8 de março de 1857, operárias de uma fábrica de tecidos, situada na cidade norte americana de Nova Iorque, fizeram uma grande greve. Ocuparam a fábrica e começaram a reivindicar melhores condições de trabalho, tais como, redução na carga diária de trabalho para dez horas (as fábricas exigiam 16 horas de trabalho diário), equiparação de salários com os homens (as mulheres chegavam a receber até um terço do salário de um homem, para executar o mesmo tipo de trabalho) e tratamento digno dentro do ambiente de trabalho.
A manifestação foi reprimida com total violência. As mulheres foram trancadas dentro da fábrica, que foi incendiada. Aproximadamente 130 tecelãs morreram carbonizadas, num ato totalmente desumano.
Porém, somente no ano de 1910, durante uma conferência na Dinamarca, ficou decidido que o 8 de março passaria a ser o "Dia Internacional da Mulher", em homenagem as mulheres que morreram na fábrica em 1857. Mas somente no ano de 1975, através de um decreto, a data foi oficializada pela ONU (Organização das Nações Unidas).
Objetivo da Data 
Ao ser criada esta data, não se pretendia apenas comemorar. Na maioria dos países, realizam-se conferências, debates e reuniões cujo objetivo é discutir o papel da mulher na sociedade atual. O esforço é para tentar diminuir e, quem sabe um dia terminar, com o preconceito e a desvalorização da mulher. Mesmo com todos os avanços, elas ainda sofrem, em muitos locais, com salários baixos, violência masculina, jornada excessiva de trabalho e desvantagens na carreira profissional. Muito foi conquistado, mas muito ainda há para ser modificado nesta história.

Conquistas das Mulheres Brasileiras 
Podemos dizer que o dia 24 de fevereiro de 1932 foi um marco na história da mulher brasileira. Nesta data foi instituído o voto feminino. As mulheres conquistavam, depois de muitos anos de reivindicações e discussões, o direito de votar e serem eleitas para cargos no executivo e legislativo.

Marcos das Conquistas das Mulheres na História 

  • 1788 - o político e filósofo francês Condorcet reivindica direitos de participação política, emprego e educação para as mulheres.

  • 1840 - Lucrécia Mott luta pela igualdade de direitos para mulheres e negros dos Estados Unidos.

  • 1859 - surge na Rússia, na cidade de São Petersburgo, um movimento de luta pelos direitos das mulheres.

  • 1862 - durante as eleições municipais, as mulheres podem votar pela primeira vez na Suécia.

  • 1865 - na Alemanha, Louise Otto, cria a Associação Geral das Mulheres Alemãs.

  • 1866 - No Reino Unido, o economista John S. Mill escreve exigindo o direito de voto para as mulheres inglesas

  • 1869 - é criada nos Estados Unidos a Associação Nacional para o Sufrágio das Mulheres

  • 1870 - Na França, as mulheres passam a ter acesso aos cursos de Medicina.

  • 1874 - criada no Japão a primeira escola normal para moças

  • 1878 - criada na Rússia uma Universidade Feminina

  • 1901 - o deputado francês René Viviani defende o direito de voto das mulheres 

    Do site: Sua Pesquisa

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Os governos de esquerda e a “vacância da história”


Não estamos diante apenas de golpes de estado tradicionais. Estamos diante de uma versão mais sofisticada deles, que vêm através de justificativas parlamentares e jurídicas que antecedem ou se sucedem aos acontecimentos propriamente ditos.

No Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, um dos temas debatidos foi a continuidade/sobrevivência dos governos progressistas na América Latina.
Estamos diante de uma ofensiva generalizada no continente por parte das várias direitas, que compõem uma verdadeira orquestra sinfônica com temas, práticas e argumentações que funcionam como um verdadeiro “maestro” de suas ações, ainda que elas possam diferir no estilo e na intensidade.

Do ponto de vista da linguagem que coroa/impulsiona essas ações, uma relativa novidade foi o uso, cada vez mais presente, da expressão “de facto” para caracterizar o governo golpista de Micheletti, em Honduras.
“De facto” é uma expressão jurídica que se opõe a “de jure”. Essa última quer dizer “de direito”. A primeira quer se refere a “algo implementado na prática, mas não necessariamente com amparo legal”.

A versão mais sofisticada, e ao mesmo tempo a mais grosseira, dessa nova “teoria do de facto”, foi apresentada por Alexandre Garcia em artigo comentado magistralmente por Argemiro Ferreira. Segundo essa teoria, em 1964 as Forças Armadas Brasileiras expulsaram o Presidente João Goulart, um perigoso comuno-cripto-sindicalista (o termo é meu) que ameaçava a ordem legal do país. O Congresso Nacional, diante dessa situação “de facto” criada, escolheram o Marechal Castello Branco como novo presidente.

Essa versão da teoria do “de facto” elide a história: nada conta para ela, senão a tela em frente. Esquece a campanha férrea e suja contra o governo, os desmandos, os arbítrios, as conspirações, as tramas, a violência, tudo. Cria, ao lado da nova situação “de facto”, uma “vacância da história”, que cria, por sua vez, uma “vacância jurídica”. Diante da tabula rasa feita a partir da destruição da ordem jurídica, é necessário criar outra do nada, como se nada houvesse antes.

Mais ou menos como se um disco voador marciano chegasse em Hiroshima no dia 7 de agosto de 1945 e diante dos patéticos escombros seus tripulantes dissessem: “nossa, que lixaria deixaram aqui, vamos varrer tudo isso e construir a nossa nova civilização, a nossa nova história”.

A “teoria do de facto” teve diferentes aplicações nas Américas, e não só na Latina. Uma delas foi a eleição por um voto de diferença (4 x 3) de George Bush, o filho, da Suprema Corte norte-americana, que julgava a fraude eleitoral perpetrada na Florida, que dava os votos necessários ao candidato republicano. A boa razão recomendava a anulação do pleito, da contagem, e a realização de novas eleições no Estado. Prevaleceu a teoria de que “o que está feito, feito está”. Amargo remédio.

Outra aplicação constante se deu no Haiti, em que os Estados Unidos tiraram, repuseram e tiraram de novo o presidente Jean Baptiste Aristide do poder, com diferentes alegações, criando sucessivas situações “de facto”.

Houve também a explicação do golpe contra o presidente Hugo Chavez, em 2002, na Venezuela. Unidades do Exército, diante do perigo de ruptura institucional, prenderam e exigiram a renúncia do presidente, que foi levado dali. Usou-se essa “renúncia” como argumento legal para justificar a “vacância” do cargo. Diante desse “vazio institucional”, chefes militares “convidaram” Pedro Carmona para ocupar o palácio Miraflores. A tudo a mídia comprometida deu cobertura, criando imagens manipuladas para justificar a violência, inclusive recusando-se a noticiar que a multidão ao redor do palácio exigia a volta do presidente deposto, e até que este já retornava para ele.

A quarta e mais recente foi a de Honduras.

Não estamos diante apenas de golpes de estado tradicionais. Estamos diante de uma versão mais sofisticada deles, que vêm através de justificativas parlamentares, legais e jurídicas que antecedem ou se sucedem aos acontecimentos propriamente ditos, elidindo a história e a legalidade anterior. Essa estratégia faz parte e é central entre as novas táticas da direita para assaltar o poder, seguindo a velha teoria de que uma democracia não se faz “apenas com eleições”. Esta se assenta na idéia de que entre os eleitores existem “aqueles que contam” e “aqueles que não deveriam contar”. Como se dizia no Brasil dos anos cinqüenta, depois que a “plebe” reconduziu Vargas ao poder, como pode o voto de um simples operário valer tanto quando o de um empresário, de um jurista, de um médico, etc.?

A “teoria do de facto”, da “vacância histórica” e da “vacância jurídica” se apóiam na teoria subjacente da “vacância do povo”. Essa noção “pós-moderna” (porque destituída de profundidade histórica) de democracia nos dá uma versão anacronicamente “ateniense” dela, em que a democracia vale apenas para os “mais cidadãos” do que os outros: metecos (estrangeiros), bárbaros e escravos, fora!

É provável que a “teoria do de facto” venha de novo a ser arquitetada pelo menos contra o presidente Lugo, do Paraguai, ameaçado de ser acusado de qualquer coisa no Parlamento para se votar o seu afastamento. Em outras circunstâncias é difícil se discernir o seu uso. Mas não esqueçamos que as direitas são unidas, eficazes e criativas. “Um outro de facto é possível”, sempre.


Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.