"Colocando-se no âmbito das lutas, Foucault propõe-se uma analítica que visa não
desvendar a constituição interna do poder — o que seria observar o uso da mesma
racionalidade universalista que ele critica —, mas o que denominou o antagonismo; ou mais rigorosamente, o agonismo das estratégias. Trata-se, pois, de uma abordagem indireta, tal como a que pretende na genealogia do poder definir a sanidade pelos efeitos da medicina, e as relações jurídicas e políticas pela análise da prisão. Ora, lutas dos indivíduos são reações à individualização operada pelas relações de poder. É coerente, pois, que se materialize uma segunda concepção de sujeito, aquele que reage e luta, e isso apesar de ser ele um efeito que é produzido pelo poder. Esta reação "é uma forma de poder que faz dos indivíduos sujeitos. Há dois significados para a palavra sujeito: sujeito a alguém pelo controle e dependência, e preso à sua própria identidade por uma consciência ou autoconhecimento."Esta segunda
característica relativiza a importância das relações de poder, incluindo, ainda que de início obscuramente, a condição de luta "contra aquilo que liga o indivíduo a si mesmo e o submete, deste modo, aos outros (lutas contra a sujeição, contra as formas de subjetivação e submissão)." Até então, o Foucault da genealogia operara apenas com a primeira acepção, como a subjetivação primeira, a qual não inclui a segunda, porque não fornece para o saber de si senão a condição exterior, da ação do poder sobre uma individualidade já regularizada. Assim, o sujeito consumava-se como o resultado das relações de poder que o constituíam como tal, em um dado período da história. Tomar consciência de sua identidade ou remeter-se ao autoconhecimento significa, no entanto, mais do que meramente perceber-se dominado por forças exteriores que inclusive limitam o que deve ser conscientizado; ver-se significa
redimensionar esses resultados objetificados por relações de poder estabilizadas. Tal
regularidade dos mecanismos de poder, sob essa nova concepção, só se fazia possível pela modificação de relações anteriores. Essa mudança é decorrente de uma relação que Foucault define como relação de confronto."
Trecho do Livro de
Cesar Tadeu Fontoura
Michel Foucault e a problematização do poder
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